Esgoto que escorre para o mar: poluição no riacho Maceió contamina a Praia do Mucuripe, em Fortaleza

  • 31/10/2025
(Foto: Reprodução)
Poluição no riacho Maceió afeta balneabilidade da Praia do Mucuripe Ao caminhar pelas margens do Riacho Maceió, em Fortaleza, o que se vê é um cenário preocupante: águas turvas e malcheirosas, resíduos sólidos espalhados pelo leito e o constante fluxo de esgoto doméstico. O problema se agrava porque o riacho deságua na Praia do Mucuripe, levando toda a poluição para o mar. A situação ameaça a vida aquática, compromete a balneabilidade da praia, coloca em risco a saúde pública e pode prejudicar atividades econômicas, como a pesca e o turismo, segundo especialistas. ✅ Clique aqui para seguir o canal do g1 Ceará no WhatsApp Um relatório sobre a qualidade da água na foz do riacho Maceió, elaborado pelo Instituto de Ciências do Mar (Labomar) da Universidade Federal do Ceará (UFC), reúne estudos realizados entre 2003 e 2022 na Praia do Mucuripe. Os dados mostram que a concentração de coliformes termotolerantes na água da praia estava acima do limite permitido, indicando que a água está imprópria para banho. Riacho Maceió leva poluição diretamente ao mar, comprometendo a balneabilidade e ameaçando a vida marinha no Mucuripe. Kid Junior/SVM 🦠 O que são coliformes termotolerantes? São bactérias presentes principalmente nas fezes de seres humanos e animais, que indicam contaminação fecal na água. Eles funcionam como indicadores biológicos de poluição, mostrando que há risco de transmissão de doenças por contato com a água contaminada. A Superintendência Estadual do Meio Ambiente (Semace) divulga semanalmente o boletim de balneabilidade das praias de Fortaleza. Seguindo a Resolução do Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama), a classificação utiliza enterococos (tipo de bactéria que vive no trato gastrointestinal) como indicador de contaminação para informar se cada praia está própria ou imprópria para banho com base em análises laboratoriais. Na análise, a Praia do Mucuripe é dividida em quatro trechos. O g1 avaliou os resultados dos 39 boletins publicados entre janeiro e setembro de 2025. O trecho onde o Riacho Maceió deságua não apresentou condições próprias para banho em nenhum dos relatórios. Entre os outros três trechos da praia, um chegou a ser considerado próprio em apenas dois boletins. Balneabilidade da praia do Mucuripe Louise Dutra/SVM A foz da poluição Lixo, esgoto e descuido transformam o Riacho Maceió em um canal de poluição. Kid Junior/SVM O Riacho Maceió está inserido na Faixa de Preservação Ambiental de Recursos Hídricos – ZPA 1, uma zona de proteção ambiental que integra a Macrozona de Proteção Ambiental do município. Uma Zona de Preservação Ambiental (ZPA) tem como objetivos: Preservar os sistemas naturais, permitindo apenas o uso indireto dos recursos ambientais; Incentivar a realização de estudos e pesquisas científicas; Promover atividades de educação e interpretação ambiental; Estimular o turismo ecológico; Preservar sítios naturais singulares ou de grande beleza cênica; Proteger ambientes que garantam condições para a existência ou reprodução de espécies da flora local e da fauna residente ou migratória; Garantir o uso público das praias. Zonas de proteção ambiental em Fortaleza: como são definidas as ZPA, ZRA e ZIA Em vez de ser espaço de preservação, pesquisa e lazer sustentável, o Riacho Maceió hoje é foco da poluição urbana que ameaça tanto a saúde da população quanto os ecossistemas costeiros. Em 2021, o Ibama identificou despejo de esgoto por canos clandestinos diretamente no leito do riacho. O problema, no entanto, não é recente: pesquisas realizadas desde 2003 já apontavam sinais de contaminação na Praia do Mucuripe, onde o riacho deságua em uma das principais áreas turísticas de Fortaleza. Isso significa que a poluição despejada no riacho chega ao mar, comprometendo a qualidade da água da praia e ameaçando o equilíbrio do ecossistema marinho. Despejo irregular de esgoto no Riacho Maceió causa poluição da Praia do Mucuripe. Jemmyle Cunha/SVM O professor adjunto do Labomar, Michael Viana, explica que a poluição oriunda do Riacho Maceió afeta principalmente a área do Parque Bisão, onde o riacho deságua. A poluição se estende até o Espigão do Náutico, fazendo com que as águas poluídas do Riacho Maceió fiquem acumuladas na região. Contudo, o impacto não se limita a essa área. A poluição também alcança a enseada do Mucuripe, localizada à direita de quem olha para o mar. "Existe uma espécie de rodamoinho marítimo naquela enseada, que são correntes que ficam girando na enseada do Mucuripe, fazendo com que esses poluentes fiquem acumulados ali também", descreve. Segundo Michael, a principal fonte de poluição do riacho é o esgoto doméstico lançado diretamente no leito, proveniente das residências situadas ao longo da margem. Existe também a poluição oriunda das fossas sépticas, que acabam contaminando o solo e o lençol freático, levando o esgoto até o riacho por meio subterrâneo. Saúde pública, impacto ecológico e prejuízo à pesca Às margens do Riacho Maceió, o mau cheiro e o esgoto fazem parte da rotina de quem vive e trabalha na região. Kid Junior/SVM A situação do Riacho Maceió ameaça a saúde da população e prejudica o equilíbrio ecológico. A professora Oscarian Sousa, do Labomar, explica que a água contaminada por esgoto contém microrganismos patogênicos como bactérias, vírus e protozoários, responsáveis por doenças como hepatite, diarreia, cólera e giardíase. Pessoas que entram em contato com essa água, seja ao nadar, pescar, usar para irrigação ou para consumo sem tratamento podem ser infectadas. Essa contaminação também pode favorecer a proliferação de insetos que são vetores de doenças como dengue. A contaminação também causa a redução do oxigênio dissolvido na água, que é essencial para a sobrevivência de peixes e outros seres vivos aquáticos. Sem oxigênio suficiente, os organismos não conseguem respirar corretamente, o que pode levar à morte de muitas espécies. A poluição também ameaça a atividade pesqueira, prática comum na Praia do Mucuripe, devido à presença de produtos químicos e metais pesados na água, que são tóxicos para os animais aquáticos. Pesquisas apontam presença de coliformes termotolerantes e enterococos acima do permitido na água da praia. Kid Junior/SVM Os produtos se acumulam nos tecidos de peixes, crustáceos e outros organismos aquáticos, assim como microrganismos patogênicos, como bactérias e vírus, que podem causar doenças tanto em animais quanto em seres humanos que entram em contato com a água ou consomem esses organismos contaminados. “Os peixes que conseguem sobreviver em águas contaminadas podem estar impróprios para o consumo humano, devido ao acúmulo de substância tóxicas e microrganismos patogênicos que representam um risco para a saúde dos consumidores”, pontua. Na avaliação da professora, a poluição também pode repercutir negativamente no fluxo de frequentadores e turistas, comprometendo as atividades de lazer e esporte, o que pode ocasionar perdas significativas para o comércio na região. O que está sendo feito Em agosto de 2023, o Ministério Público do Ceará instaurou um inquérito civil após uma denúncia do Ibama sobre despejo de efluentes no Riacho Maceió. O Instituto identificou canos de esgoto despejando diretamente no leito, além do acúmulo de resíduos como garrafas PET, copos, sacos plásticos, isopor, conexões plásticas e outros materiais. A promotora de Justiça Ann Celly Sampaio, titular da 135ª Promotoria de Justiça de Defesa do Meio Ambiente, é a responsável pelo caso. Segundo ela, o MPCE atua como articulador entre os órgãos competentes, promovendo audiências públicas para definir responsabilidades e cobrar providências efetivas. O g1 esteve presente na audiência realizada no dia 16 de setembro de 2025 e acompanhou as demandas discutidas. Entenda o papel do Ministério Público no caso do Riacho Maceió. Louise Dutra/SVM Para a promotora, a situação é complexa, pois envolve múltiplas esferas de atuação. A Companhia de Água e Esgoto do Ceará (Cagece) e a Ambiental Ceará são responsáveis pelo sistema de saneamento básico, mas o combate ao despejo irregular exige uma abordagem mais ampla e integrada. A nossa expectativa maior é que o problema seja resolvido; que tenha a rede adequada de esgoto; que as pessoas tenham moradia digna; e que haja fiscalização e punição dos infratores. A gente sabe que a situação do Maceió é complexa, mas tudo isso acaba desaguando no oceano e a gente não quer que Fortaleza fique como outras capitais, onde os turistas não podem tomar banho na orla. A seguir, entenda quais são os principais desafios enfrentados e quais ações estão em andamento. ➡️ Serviços de esgotamento sanitário Conheça o caminho que a água faz até chegar à sua casa A Companhia de Água e Esgoto do Ceará (Cagece) é responsável pelos serviços de água e esgoto em Fortaleza. Atualmente, a companhia mantém uma Parceria Público-Privada (PPP) com a Ambiental Ceará, que cuida do esgotamento sanitário na capital e em outros municípios do Estado. Um levantamento cadastral realizado na região do entorno do Riacho Maceió identificou 2.994 imóveis distribuídos da seguinte forma: 1.668 imóveis estão conectados à rede de esgoto; 322 imóveis não estão conectados, mas possuem rede disponível; 1.004 imóveis não têm acesso à rede disponível. Segundo a Cagece, os imóveis ainda sem rede disponível serão atendidos por obras previstas para a universalização dos serviços. 💡 Entenda: O plano de PPP estabelece metas específicas de expansão dos serviços de esgoto. A meta é alcançar 90% de cobertura de esgoto até o ano de 2033 e 95% até 2040. As obras de universalização também englobam as ligações domiciliares dos imóveis. Dos 322 imóveis que possuem rede de esgoto disponível, mas ainda não estão conectados, a Cagece apontou a seguinte situação: 234 imóveis possuem rede disponível, mas estão sem a caixa de inspeção. A caixa de inspeção é a estrutura na calçada que realiza a ligação entre a tubulação interna do imóvel e a rede pública de esgoto, sendo essencial para a coleta e tratamento. A ausência desta estrutura pode estar contribuindo para o despejo irregular no riacho. 62 imóveis estão sem condição de interligação. A Ambiental Ceará aponta que esses casos podem envolver limitações técnicas, estruturais ou legais que impedem a conexão. 26 imóveis possuem caixa de inspeção e rede disponível, mas não estão conectados. Estes casos são apontados como de responsabilidade do saneamento, sendo de interesse da empresa garantir a realização da conexão. "A Ambiental reforça que realiza ações de sensibilização porta a porta em todos os territórios onde atua, incluindo na área citada, com o objetivo de conscientizar a população sobre a importância da conexão dos imóveis à rede", informou a empresa. Embora as empresas tenham a responsabilidade de implantar e manter a infraestrutura de esgoto, a Cagece destaca que a fiscalização de ligações irregulares, o manejo da drenagem, a limpeza e as soluções individuais em áreas sem rede disponível ficam a cargo do município. Como se interligar à rede de esgoto no Ceará? ➡️ Manutenção e limpeza das galerias pluviais As galerias pluviais são projetadas para escoar a água da chuva e prevenir alagamentos. No entanto, em áreas sem rede de esgoto adequada, é comum que imóveis realizem ligações clandestinas, despejando esgoto diretamente nas galerias pluviais. O despejo de esgoto nesses locais traz consequências graves: fezes, gordura e produtos químicos contaminam o solo e a água, comprometendo todo o ecossistema; Os efeitos vão além da poluição visível: o mau cheiro invade as ruas, enquanto a proliferação de insetos, ratos e baratas representa uma ameaça direta à saúde pública; Problemas na infraestrutura urbana: o esgoto carrega resíduos sólidos, como lixo doméstico, que entopem a rede de drenagem e aumentam o risco de alagamentos, especialmente durante o período de chuvas. A responsabilidade pela manutenção e limpeza das galerias pluviais é da Secretaria de Infraestrutura (Seinf). Em nota, a pasta informou que “realiza periodicamente ações de manutenção e limpeza nas galerias, de acordo com as necessidades identificadas nas vistorias técnicas ou a partir de solicitações registradas pela população”. A Secretaria ainda afirmou que está concluindo o trecho final das obras de requalificação do Riacho Maceió, localizado na confluência das ruas Tavares Coutinho e Dr. Alísio Mamede. Além da urbanização, o projeto também contemplou obras de saneamento básico na comunidade dos Canos. ➡️ Construções irregulares Um dos principais agravantes na região é a presença de construções irregulares ao longo das margens do riacho, que contribuem diretamente para o despejo ilegal de esgoto. As residências estão situadas dentro de uma Zona de Proteção Ambiental (ZPA), o que impede a realização de obras de urbanização e infraestrutura no local. Diante dessas restrições, a Prefeitura afirma que a única solução definitiva para o problema é a remoção das famílias para áreas adequadas, onde possam receber moradia com acesso a saneamento e serviços essenciais. Como parte desse processo, a Secretaria do Desenvolvimento Habitacional (Habitafor) realizou em maio uma reunião com dez famílias da Comunidade Saporé, localizada no bairro Mucuripe, às margens do Riacho Maceió. Durante o encontro, a Habitafor ofereceu aos moradores a inclusão no programa Aluguel Social, garantindo apoio financeiro temporário até que sejam reassentados em um dos 14 conjuntos habitacionais atualmente em construção na capital. ➡️ Fiscalização e análises A Agência de Fiscalização de Fortaleza (Agefis) informou que realizou 94 ações de fiscalização no entorno do Riacho Maceió, entre os meses de agosto e setembro deste ano, com o apoio da Cagece e da Ambiental Ceará. As vistorias resultaram na emissão de 29 notificações a imóveis que não estavam conectados à rede pública de esgoto. Paralelamente, a agência também realizou na região a operação DNA do Lixo, ação em parceria com a Secretaria Municipal da Conservação e Serviços Públicos (SCSP), que tem como objetivo identificar a origem e os responsáveis pelo descarte irregular de resíduos. As equipes realizaram vistorias em dez trechos próximos ao riacho, definidos a partir de pontos de acúmulo de lixo, resultando no registro de três autos de infração. Já a Secretaria Municipal do Urbanismo e Meio Ambiente (Seuma) afirmou que realiza análises da qualidade da água do riacho e de seus afluentes a cada dois meses. O objetivo é acompanhar as condições do recurso hídrico e identificar possíveis fontes de contaminação. A pasta reforçou que fez o estudo diagnóstico socioambiental do Parque Linear do Riacho Maceió, publicado em fevereiro. O documento apresenta um panorama dos aspectos socioambientais da região, com destaque para a qualidade da água e as pressões ambientais observadas no entorno. O estudo aponta que a qualidade da água do Riacho Maceió está bastante comprometida, constatando lançamento irregular de esgoto e descarte de lixo ao longo do curso do riacho. Mesmo assim, ainda ocorre pesca e banho em alguns trechos, o que representa risco sanitário. O diagnóstico integra as etapas de desenvolvimento do plano de manejo do parque, que servirá como guia técnico para ações de preservação, conservação e uso sustentável da área. Assista aos vídeos mais vistos do Ceará:

FONTE: https://g1.globo.com/ce/ceara/noticia/2025/10/31/esgoto-que-escorre-para-o-mar-poluicao-no-riacho-maceio-contamina-a-praia-do-mucuripe-em-fortaleza.ghtml


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